Tuesday, February 12, 2013

A (QUASE) ÚLTIMA VITÓRIA DE CAMILO CHRISTÓFARO



Por Carlos de Paula

Camilo Christófaro foi um dos mais populares pilotos brasileiros dos anos 50 e 60. Sobrinho de Chico Landi e mecânico por profissão, não podia dar outra: Camilo acabou virando piloto, obtendo muito sucesso em Interlagos com uma grande variedade de carros, desde FNMs JK até ex Maseratis de F-1 equipadas com motor Corvette, os temíveis Mecânica Continental. Sua carretera número 18 (na última versão) é um dos carros mais lembrados e amados do automobilismo brasileiro, certamente a mais popular carretera,correndo até 1971.

No começo dos anos 70, o automobilismo nacional mudara e já não havia lugar para as carreteras. A 18 tornara-se anacrônica, além de proibida, visto que era equipada com motor Chevrolet Corvette americano. Assim que em 72 Camilo adquiriu um protótipo Fúria, equipando-o com motor Chrysler, correndo com esse carro na Divisão 4 em 1972 73. Nesse último ano lançara-se a Divisão 1, com provas de longa duração e carros com reduzido preparo, e também foi lançado o Ford Maverick V-8. Grande amante dos V-8, Camilo logo se entusiasmou com o modelo e a categoria. Nos anos seguintes, participaria de diversas corridas de Divisão 1 e 3, com Mavericks preparados pela Escuderia Lobo.

Em 1975 a Divisão 1 estava em franca expansão. As 25 Horas de Interlagos não foram realizadas naquele ano, decidindo-se realizar uma prova mais curta, as 500 Milhas de Interlagos. Como as 25 Horas, a prova também fora organizada pelo Avallone Motor Clube, de Antonio Carlos Avallone, e seria realizada na pista completa de Interlagos. Nessa época, a maioria das provas de Interlagos contava com a experiente equipe Sget’s de cronometragem, mas nessa prova estrearia uma nova equipe, a Racing Crono.
 
A Equipe Tecnomotor teve forte presença na Divisão 1 em 1975. Aqui Beto Monteiro, em Brasilia
Entretanto, a prova foi vítima de uma série de confusões, algumas inevitáveis, como a climática. Apesar de 71 carros inscritos, a principal equipe da Divisão 1, a punida Mercantil-Finasa, na qual corria José Carlos Pace, não participaria da corrida embora contasse com a autorização da CBA. Depois, choveu nos treinos de classificação. A maioria dos carros foi para a pista molhada, marcando tempos altíssimos, mas quase no final dos treinos parara de chover e a pista começava a secar. O esperto piloto paranaense Edson Graczyk ficara com seu Opala da equipe Tecnomotor parado nos boxes enquanto chovia. Quando parou de chover, e a pista começou a secar, Graczyk prontamente foi para a pista e marcou a pole position em 4’10”1, com certa facilidade. Em segundo ficou outro Opala de Sergio Carvalho, que não era habituée das primeiras posições, e em terceiro Camilo Christófaro, o primeiro com Maverick. O primeiro Passat, de Alberto Ferreira e Rafael da Luz, marcara o 9° tempo, na frente de diversos carros da Classe C, com 4’15”08, dando uma idéia da aparência inusitada do grid.
 
O Maverick 18 dos Camilos 
Cabe lembrar que nessa época os Maverick simplesmente acabavam com os Opalas nas provas de Divisão 1. A única grande vitória do Opala fora nas 25 Horas de 1974, e os produtos da Ford ganharam todas as outras provas. Assim que a pole de um Opala fez bastante surpresa, e por que não, até mesmo o 3° de Camilo surpreendeu. Este correria em parceira com seu filho Camilo Christófaro Júnior, certamente realizando um sonho ao largar em tão boa posição, junto com o filho. Todo pai cujos filhos correm certamente sonham em correr em dupla, e porque não, ganhar corridas com os rebentos. Os casos são inúmeros não só no automobilismo brasileiro, como internacional.

As 500 Milhas foram transmitidas na TV e a Itacolomy, concessionária Chevrolet, estava oferecendo prêmios para os primeiros, segundos e terceiros colocados com carros da marca, tanto na classe C (Opala) como na A (Chevette). O automobilismo brasileiro dava sinais de evolução nessa época, apesar das pisadas na bola, como veremos a seguir.

No domingo acabou não chovendo, e Camilo Christófaro fez a melhor largada, diga-se de passagem dentro do horário programado, pulando diretamente para a primeira posição. Não só Camilo largou melhor, como começou a abrir distância do segundo colocado Graczyk. Era o Camilo de antigamente, que após 40 minutos de prova, já tinha 23 segundos de diferença sobre o segundo colocado, Arthur Bragantini. Com uma hora de prova, Camilo entrou nos boxes para reabastecer e passar a direção do Maverick número 18 a seu filho, que logo voltou à ponta. Júnior não só manteve a primeira posição, como expandia a diferença em relação aos segundos colocados. Parecia certo que a dupla de Camilos ganharia a prova. Infelizmente, o destino foi outro.
 
Mavericks brigando
Posteriormente, Camilo pai confessou, em uma versão, que muito lhe emocionou a possibilidade de ganhar uma prova em dupla com o filho, e acabou fazendo uma rara burrada. Em outra explicação, disse que foi brincar com Toco, seu amigo de muitos anos, fazendo alguns sinais. Distraiu-se e acabou batendo. Apesar de ter ganho inúmeras disputas em duas décadas, inclusive as Mil Milhas Brasileiras de 1966, Camilo nunca ganhara uma prova com o filho, e há algum tempo estava em jejum de vitórias importantes. Seja a emoção ou brincadeira que lhe fez perder a concentração na volta 59, o sonho dos Camilos terminou em abandono na Curva do Sul. Disse a um repórter “Pode escrever aí que eu sou um salame. Dei uma bobeada. Há vinte anos que corro e hoje aprendi mais uma”. Infelizmente, nunca mais Camilo teve a mesma oportunidade de ser tão competitivo em uma corrida.

Após o abandono de Camilo, a tal equipe Racing Crono simplesmente perdeu o controle da corrida. Na realidade, a única certeza que tinham era de que os Camilos lideravam, e quando estes abandonaram, nem sabiam quem era o líder, tampouco quem ocupava as outras posições. Passaram então a proibir a entrada dos jornalistas na torre de cronometragem, para encobrir sua inépcia. A imprensa, dando cobertura televisiva, não sabia o que dizer ao público, e passou a recorrer aos mapas de corrida extra-oficiais, preparados por algumas equipes, como Chico Landi, Itacolomy, Sonnervig-Vicsa e Manah. Estes apontavam Aloysio/Cesar em primeiro, seguidos de Campello, Bragantini, Graczyk e Marinho Amaral. O clima foi ficando pesado, e o organizador Antonio Carlos Avallone começou a sofrer todos os tipos de pressão, dentre outros do presidente da CBA, Charles Naccache, que estava presente na pista. Após a divulgação dos resultados oficiais, depois de 6 horas de corrida, ocorreu o inevitável: uma enxurrada de protestos. Reynaldo Campello/Marivaldo Fernandes, da Itacolomy, achavam que eram os vencedores, mas Aloysio/Cesar e Graczyk/Carpes também achavam. Resultado: os mapas de corrida tiveram de ser completamente revisados até as 2 horas da manhã, e a divulgação oficial dos vencedores ocorreu  longos 15 dias depois: Aloysio Andrade Filho e Ricardo Lenz Cesar, com Maverick na classe C, e Francisco Artigas/Eduardo Dória com Passat na Classe A. Edson Graczyk e Oswaldo Carpes foram o Opala melhor colocado, em 4° na geral, mas acabaram desclassificados por estarem abaixo do peso. Os Opalas da Itacolomy também acabaram desclassificados, e no final foram Júlio e Marcos Tedesco que levaram os Cr$5.000 da Itacolomy. A desclassificação de Graczyk/Carpes e Campello/Marivaldo se deu a um erro da própria GM, que não havia atualizado o peso dos carros na homologação junto à CBA. Como os Opala estavam saindo da fábrica menos pesados, por usarem componentes mais leves, e o peso indicado na homologação era o antigo, os comissários acabaram desclassificando esses Opalas.

Os mais supersticiosos diriam que foi praga do Camilo!

Resultado Oficial Final das 500 Milhas de Interlagos de 1975:
Classe C e Geral
1. Aloysio Andrade Filho/Ricardo Lenz Cesar – Maverick n° 28 – 92 voltas
2. Artur Bragantini/Tite Catapani – Maverick n° 26 – 92 voltas
3. Marinho Amaral/Manoel Jesus Ferreira – Maverick n° 29 – 92 voltas
4. Júlio Tedesco/Marcos Tedesco – Opala n° 3 – 91 voltas
5. Celso Frare/Carlos Andrade – Opala n° 5 - 91 voltas

Classe A
1. Francisco Artigas/Eduardo Doria – Passat (10° na geral)
2. Alberto Ferreira/Rafael da Luz – Passat
3. Otto Carvalhaes/Alexandre Negrão – Passat
4. Carlos Amaral/Glen Henrique – Passat
5. Charles Marzanasco/Charles Marzanasco Filho - Passat

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