Wednesday, February 20, 2013

12 Horas Internacionais



Quem diria, hoje o Autódromo de Goiânia é palco de bailes funk, quase uma favela. Justo a pista que julgava ter vocação para sediar provas internacionais (a prevista corrida de estreia, em 1973, que nunca foi realizada, estava no calendário da FIA como prova internacional para carros esporte). Eventualmente, sediou corridas do campeonato mundial de motos, sem contar provas da SUDAM F3, mas os dias de glória internacional nunca vieram.

Mas a primeira prova internacional do autódromo, pelo menos com gostinho internacional, foi a 12 Horas de Goiânia de 1975. E pelas minhas contas, foi a única corrida válida para um campeonato brasileiro que contou com participação estrangeira nos anos 70.

Não que houvesse muita gente de fora. De fato, quatro argentinos participaram da prova. Com um Maverick da Tenenge, Juan Maria Traverso, que eventualmente correu na F2 europeia, e Jorge Recalde. Num Opala da Itacolomy, Oscar "Cacho" Fangio e Fernando Ferrari.

Apesar da simpática presença dos pilotos estrangeiros, tiveram pouco impacto nos resultados. O Maveco abandonou com 60 voltas, e o Opala, com 68.

Apesar disso, a corrida, ganha por Paulo Gomes e José Carlos Pace, com Maverick da Equipe Mercantil Finasa-Motorcraft, teve lá suas efemérides.

A pole position foi obtida por Luis Estevão, com Maverick da Retífica Brasiliense. Sim, esse mesmo Luis Estevão, ex-senador, cassado, envolvido na questão Lalau (Luis, que já era riquíssimo muito antes de se tornar político e com certeza não precisa de dinheiro, alega inocência) e que quer voltar à política. Na época Estevão corria, e não era um mau piloto. Só que a pole foi contestada. Na prova, ele e seu companheiro Marco Emílio Pires correram entre os primeiros, mas os dois pilotos de Brasília só completaaram 265 voltas. Os melhores pilotos do Planalto Central nestas 12 Horas de Goiânia foram Alencar Junior e Roberto Jabur, com um Opala.

O carro de Estevão. Ah, a exuberância da juventude...

Outra coisa curiosa foi a presença de uma equipe do Espírito Santo, local não muito conhecido pela sua contribuição ao automobilismo. E não fizeram feio. A duppla Coser e Schuch correu com um Passat, e chegou em terceiro na classe.

O primeiro abandono foi do único Alfa Romeo 2300 da corrida, que abandonou com 4 voltas. Só dois carros correram na classe B (o outro um Dodge 1800), assim os carros concorreram na Classe C.

Resultado
27 de julho
Brasileiro de Divisao 1
1. Paulo Gomes/Jose Carlos Pace, Maverick, 351 (1o. classe C)
2. A. Bragantini/J.R. Catapani, Maverick, 348
3. F. Crespi/S. Mattos, Maverick, 346
4. Edgard Mello Filho/Bob Sharp, Maverick, 345
5. Alencar Junior/R. Jabur, Opala, 341
6. P.C. Lopes/W. Lomozi, Maverick, 337
7. Cairo Fontes/Eduardo Cardoso, Maverick, 337
8. Norman Casari/Mauro Sa Mota/Reginaldo Bufaical, Maverick, 336
9. Francisco Artigos/Eduardo Doria, Passat, 329 (1o. classe A)
10. W. Siqueira/F. Saknezian, Passat, 325
11. E. Cozer/Regis Schuch, Passat, 323
12.S. Boeck/Jose Andrade, Passat, 323
13.A. Manuel Nunes/R. Gibran, Maverick, 322
14. L. Paternostro/A. Sipos, Passat, 321
15. J.C.Palhares/E. Monta, Passat, 320
16. P. Iglesias/E. Pederneiras, Passat, 318
17. P. Guaraciaba/C. Braz, Maverick, 317
18. Romulo Gama/A. Buzaid Jr. Passat, 316
19. C. Almeida/P. Alonso, Passat, 314
20. M. Horbilon/L. Calil, Passat, 313
21. Silvio Poli/F. Gioia, Opala, 313
22. M. Ferraris/C. Amaral, Passat, 312
23. O. Carvalhaes/Alexandre negrao, Passat, 312
24. Ivo Mendes/L. Cavalcanti, Passat, 311
25. F. Sotto Maior/M. Veludo, Dodge 1800, 307
26. R. Savio/R. Campello, Opala, 274
27. C. Marques/Sandoval Oliveira, Passat, 273
28. M. E. Pires/L. Estevao, Maverick, 265
29. V. Consule/S. Carvalho, Opala, 262
NC
R. Dal Pont/L. Landi, Maverick
A. Rodrigues/S. Drugovich, Passat
J. Romano/F. Gondim/R. Campello, Opala
J. Bucski/C. Andrade, Maverick
E. Mesquita Jr./Afranio Filho, Passat
L. Santos/Antonio Martins Filho, Maverick
Aloisio Andrade Filho/Ricardo Lenz, Maverick,
Oscar Cacho Fangio/Fernando Ferrari/Opala
Julio Tedesco/Marcos Tedesco, Opala
J. Traverso/Jorge Recalde, Maverick 
Celso Frare/Carlos Eduardo Andrade, Opala
Newton Pereira/Jose Moraes, Maverick 
R. Consort/J. Consort, Alfa Romeo 2300
MV Aloisio Andrade Filho, 1m58.04s

Monday, February 18, 2013

Mudança da guarda ou o doce dia da vitória inicial


Recentemente o mundo se deparou com uma situação inédita na Formula 1: no GP da Austrália, as duas equipes que tinham melhores chances de ganhar a corrida eram duas equipes que nunca haviam ganho um único GP, a estreante Brawn e a já veterana Red Bull. Pois uma situação análoga ocorreu em uma importante corrida brasileira.
Nesse caso, as 12 Horas de Porto de Alegre de 1968, os carros eram o veterano Fusca e o recém lançado Ford Corcel. E os quatro pilotos desses dois carros estavam entre os 5 melhores pilotos brasileiros da época.
O VW já era produzido no Brasil desde 1952, inicialmente em forma CKD. Seria mentira dizer que o Fusca nunca houvera ganho uma corrida no Brasil nos dezesseis anos anteriores - não foi esse o caso. Entretanto, o Fusca, dentre os carros nacionais normalmente usados em corridas, tinha sido o único a não alcançar vitória geral numa das diversas importantes provas de longa distância que compunham o calendário nacional de corridas. Os sedãs JK, o Simca, o DKW e até mesmo o Gordini, todos tinham importantes vitórias nos seus currículos. O Aero-Willys era tão infrequentemente usado em competições que não se encaixa nessa pequena enquete, e o DKW Fissore e o Ford Galáxie não havia sido usados em provas de velocidade. É verdade que um Fusca híbrido, com motor Porsche, quase mata os gaúchos e suas potentes carreteras do coração na primeira edição das Mil Milhas, mas não era um Fusca puro, era quase um protótipo. A situação era tão vexatória que a própria VW veiculou, nos anos 60, uma propaganda que justificava sua ausência das pistas, frisando que era o carro predileto dos pilotos.
Já o outro protagonista desta história, o Ford Corcel, começara a ser comercializado naquele ano, substituindo o Gordini. Não vou repetir a história do Corcel pela décima vez no blog, já fiz tantas vezes que me enrola o estômago quando começo a falar do assunto. Mas cabe mencionar que esta era a primeira grande prova do novo carro nas pistas brasileiras.
As 12 Horas já tinham sido realizadas 2 outras vezes nas ruas de Porto Alegre, com grande sucesso. Esta seria a última edição da prova em pistas de rua, de fato, a última corrida de rua do Rio Grande do Sul, pois estas tinham sido proibidas pelas autoridades. No ano de 1969 voltaram a ser realizadas algumas provas de estrada, e não fosse pela inauguração de Tarumã, em 1970, a capital sulina ficaria de fora do circuito de corridas para sempre.
O Fusca em questão tinha o número sete, e era pilotado pelos irmãos paulistas Emerson e Wilson Fittipaldi (Jr). Tinha motor 1600, uma nova configuração de motor que aos poucos ajudava o Fusca a ser competitivo até mesmo nas grandes corridas nacionais. Já o Ford Corcel, tinha o número quatro, era preparado por Greco, e era pilotado pelos também paulistas Bird Clemente e José Carlos Pace.

O excepcional Fusca dos Fitti
As 12 Horas só contavam com carros de turismo de produção nacional, e portanto, os bichos papões das corridas naquele ano, o Protótipo Bino, as Alfas GTA da Jolly e os BMW da CBE não estavam presentes. O começo foi normal, com os carros de maior cilindrada, Simca e JK, liderando a corrida com certa facilidade. Aldo Costa, com Simca, disparou na frente de Lauro Maurmann (FNM), Pedro Carneiro Pereira (FNM) e Juvenal Martini (Simca). As coisas não iam bem para o Fusca dos Fittipaldi, que bateu logo na saída e perdeu cinco voltas nos boxes.

O rápido Corcel de Pace e Bird
Na vigésima segunda volta, Jaime Silva, que disputava e prova com Ugo Galina, e que fizera a pole com um bem preparado FNM, alcançou a ponta, mas incrivelmente o Fusca número 7 conseguiu alcançar o FNM na vigésima quinta volta e o ultrapassou. As três duplas paulistas dominavam, mas os gaúchos Juvenal Martini, com Simca patrocinado pela “Festa da Uva”, e Pedro Carneiro Pereira, com seu FNM, também conseguiram liderar algumas voltas.
Entretanto, quando veio a chuva, a vantagem passou a ser dos carros de menor cilindrada, pilotados por duas duplas sensacionais, Bird/Pace, Emerson/Wilson. Por volta de 183a. volta era o Corcel que liderava desde a 145a., mas os Fittipaldi aumentam o train, por ordem do seu pai experiente Wilson, e passam o Ford. E assim termina a corrida, com os irmãos Fittipaldi na frente de Bird Clemente e Jose Carlos Pace, as duas duplas fazendo 193 voltas. Em terceiro, Jaime/Galina, seguidos de José Madrid/Antonio Madrid, com Simca, Ítalo Bertão/Rui Menegaz, com Simca, e Henrique Iwers/Jan Balder com DKW. Um outro Corcel chegou em sétimo, pilotado pelos lendários gaúchos Catharino e Vitório Anderata.

Acabara a Festa da Uva dos Simca. O mesmo Juvenal Martini ganhara em 1963, com um Simca. A obsolescência começava a bater à porta
O resultado teve lá suas polêmicas. Os Fittipaldi fizeram questão de abrir o motor do seu carro para provar que estavam dentro do regulamento, mas haja quem diga até hoje que o Corcel estava com uma volta na frente, quando foi ultrapassado na 183a. volta, portanto, os vencedores teriam sido Bird e Pace. Não era a primeira, nem a última vez que uma dúvida deste tipo era lançada sobre o resultado de uma prova importante.
De qualquer modo, esta prova foi um marco, indicando o final do reinado dos mais tradicionais DKW, Gordini, Simca e FNM, que daí por dia ficariam cada vez mais obsoletos em provas de turismo, o que só viria a piorar com a estréia do Opala em 1969. Também foi a comprovação de que o Fusca, mesmo como carro de turismo, era capaz de ganhar até mesmo as provas de maior gabarito do País. Para os Fittipaldi, que passaram o ano apanhando do seu rápido mas temperamental protótipo Fitti Porsche, a vitória foi um verdadeiro alívio. Para o Ford Corcel, um início de um futuro promissor que nunca veio. Para os muitos espectadores que resolveram atravessar a pista na corrida, uma má experiência: terminaram o evento em cana!

Wednesday, February 13, 2013

25 Horas de Interlagos de 1975



Só um mentiroso, ou completo desconhecedor de automobilismo diria que corridas de 24 horas são um prato cheio para o público. Algumas exceções vêm à mente. Nesse ano de 2007, por exemplo, três carros estavam na mesma volta no final das 24 Horas de Daytona, com possibilidades viáveis de vitória. Em Le Mans, 1969, Jacky Ickx e Hans Hermann passaram a última hora duelando, e Ickx se saiu melhor, mas por muito pouco. Mas na maior parte das corridas de 24 Horas a identidade do vencedor é sabida umas boas horas antes do final, salvo por quebra, como a dolorosa falha mecânica de Pierre Levegh em Le Mans em 1952, após estar na liderança e pilotando sozinho durante 23 horas 3 meia.

Tecnicamente não estamos falando de uma corrida de 24 Horas aqui, e sim, uma de 25 Horas. A única do mundo, diga-se de passagem. Que me consta, nunca nenhum outro país realizou uma prova de 25 Horas, só o Brasil. De fato, nos três anos em que ocorreu, esta era a corrida de autódromo mais longa duração do mundo, já que as 84 Horas de Nurburgring não mais existiam. Não sei se esta era a idéia dos seus criadores, mas de fato as “25 Horas” tinham o título de corrida mais longa do mundo, durante o triênio em que foram disputadas. Depois o governo cancelou as corridas de longa distância, e nunca mais foi realizada esta prova.
Normalmente as 25 Horas tinham um bom número de inscritos, visto que era uma prova de Divisão 1. Esta também teve um grid rico em número e qualidade, com bons pilotos provenientes de diversas áreas do Brasil. Mas, em matéria de diversidade, estava mais pobre. Na Classe C, Maverick e Opalas, e um único Dodge; na “A’, só dava Passat e Chevette e um único Fusca. Nada de Classe B.

Havia muitos pilotos de categoria: Antonio Carlos Prado, de volta da Europa, dividia um Opala com Ricardo Oliveira e Antonio Cláudio Tarla; Lian Duarte, Jan Balder e Edgard Melo Filho largaram em outro Opala; Edson Graczyk, Celso Frare e o gaúcho Marcos Tedesco também de Opala, da equipe Bamerindus; Chiquinho Lameirão faria rara aparição na categoria, dividindo um Opala com os também veteranos Totó Porto e Afonso Giaffone. E diversos outros medalhões do automobilismo nacional estavam presentes: Jayme Silva, Walter Barchi, Fernando “Toco” Martins, Aloysio Andrade Filho, Arthur Bragantini, Antonio Carlos Avallone, Reynaldo Campelo, Carlos Eduardo Andrade, Ney Faustini, Newton Pereira, além do pessoal da classe A, Francisco Artigas, Luis André Ferreira, Otto Carvalhaes, Eduardo Doria, Atilla Sipos, Luiz Otavio Paternostro.
Mas, surpreendente para uma corrida assim longa, a 25 Horas de 1975 seria em grande parte uma corrida entre dois carros, um Maverick, e um Opala. Justamente os dois carros com os melhores pilotos. O Maverick 22 da Equipe Mercantil Finasa Ford alinharia com Jose Carlos Pace e Paulo Gomes, ambos campeões brasileiros da categoria naquele, com Bob Sharp de lambuja. A Equipe Itacolomy teria no Opala número 1 Alex Dias Ribeiro, Ingo Hoffmann e Alfredo Guaraná Menezes. Do começo até o fim, a corrida foi de um dos dois carros, embora o segundo Maverick da Mercantil Finasa, e os Opalas de Edgard Mello Filho e dos paranaenses Frare/Graczyk tenham se intrometido durante a fase inicial.

A corrida começou com uma hora de atraso, a la antigas corridas de Salvador. Entretanto, havia uma causa para o atraso, uma impiedosa chuva que se debatia sobre a capital de São Paulo naquele sábado. No começo, Paulo Gomes impôs um ritmo forte na pista molhada, até mesmo imprudente, após largar em terceiro. O pole havia sido Walter “Tucano” Barchi, conhecido piloto de motocicletas que fizera com sucesso a transição para as quatro rodas e fazia dupla com dois pilotos que dez anos antes haviam sido ex-colegas na Simca, Jayme Silva e Toco. Paulão sentou a pua, e já tinha 11 segundos de diferença, após meras quatro voltas. Após o primeiro reabastecimento, uma breve luta com o Opala da Bamerindus, que chegou a tomar a ponta mas seria o primeiro abandono dos carros na Classe C.

O Opala da Itacolomy logo se transformou no maior, melhor dizendo, único adversário do Ford 22, que continuava na liderança, até que Alfredo Guaraná Menezes deu uma espetacular capotada na curva da Ferradura na metade da corrida. O carro ficou obviamente com a carroceria danificada, mas em condições de seguir, e fez com que os três jovens pilotos perdessem 3 voltas para a equipe veterana.

As coisas começaram a ficar mais interessantes justo nas duas últimas horas de corrida, geralmente quando o interesse dá lugar meramente à vontade de que tudo termine logo. O Ford continuou a administrar sua diferença de 3 voltas para o carro da Itacolomy, até que simplesmente parou com defeito na bomba de gasolina, novamente na Curva da Ferradura, que estava ferrando todo mundo naquela corrida. Bob Sharp ainda conseguiu levar o carro de volta aos boxes, mas agora era a vez da Mercantil Finasa perder três voltas.

O gabola Opala n° 1 tomou a liderança, pilotado por Ingo Hoffmann, que passou a ser caçado por Pace. A chuva voltara a Interlagos, e a diferença do Chevrolet para o Ford era de 1 minuto, ou seja, pouco mais de um quarto de volta no ritmo daquela altura. Ingo se viu forçado a parar para reabastecimento e troca de piloto, e em seu lugar entrou Alex. O pitstop, que deveria demorar 30 segundos, acabou se tornando em mais um dos épicos desastres boxelógicos de Interlagos, pois um defeito no cinto de segurança causou um atraso que consumiu toda vantagem adquirida pelo n° 1. Assim, Pace retomou a ponta. Alex finalmente conseguiu sair do boxe, ao calço de Pace, e a Itacolomy ainda tinha esperanças de descontar a diferença e ultrapassar na pista. Daí, outra tragédia para o Ford: a bomba de gasolina deu pau novamente, e Pace voltou aos boxes. Justo quando os torcedores GM começavam a comemorar, Alex bateu o Opala com força na curva do Sargento!!!! Apesar da segunda pancada do dia, o Opala voltou à competição atrás do Ford, caindo aos pedaços. Daí por diante, Pace conseguiu administrar o resultado, sem nenhuma surpresa adicional, chegando somente uma volta à frente de Alex. Na classe A, Francisco Artigas, Luiz André Ferreira e Pedro Ferreira conseguiram completar 331 voltas, ganhando a classe e chegando em 8° lugar na geral, com um Passat, uma excelente performance, relativa, porém menos voltas do que Chevette vencedor da classe em 1973.

O evento acabaria sendo a última edição da sui generis 25 Horas, e, infelizmente, seria também a última vitória do saudoso José Carlos Pace, que teve uma temporada infeliz em 1976 e perdeu a vida em um acidente de avião em 1977. Ninguém poderia imaginar isso.

Tuesday, February 12, 2013

DIVISÃO 4 – A CATEGORIA QUE QUASE DEU CERTO




Por Carlos de Paula

Para o aficcionado de automobilismo atual é quase impossível imaginar que nos anos 60 carros esporte chegaram a ameaçar a hegemonia de todas as outras categorias do automobilismo, inclusive a F-1. Isso, em ambos os lados do mundo. Na Europa, era fácil ver por que Ferraris de 3 litros ou mais pareciam mais interessantes do que a Fórmula 1 de parcos 1,5 litro. E com a chegada da Ford, em 1964, o interesse se voltou quase todo às épicas batalhas entre italianos e americanos (Ferrari x Ford). A estes juntaram-se, no curso de poucos anos, Chaparral, Mirage, Alfa-Romeo, Howmet, Matra, Lola-Aston Martin e Chevrolet, além das sempre presentes Porsches, e carros de baixa cilindrada, como Chevron, etc.

Do outro lado do Atlântico, existia uma raquítica Nascar, com calendário repleto de corridas em pequenas pistas de terra, e um esquizofrênico campeonato de Fórmula Indy, que incluía diversos tipos de carros, para pistas de asfalto, subida de montanha e terra. E surgiu o Grupo 7, com um regulamento liberal, sem limite de cilindrada e potência. Era a série Can-Am, que apesar da hegemonia da McLaren, entre 1967 a 1971, atraía estrelas européias, visto que os prêmios eram bem polpudos para os padrões da época (era conhecida como a milionária série Can-Am), muito divulgada nas revistas especializadas brasileiras.
 
Tarumã, 1971 - a frente, dois Porsches da Hollywood. Mais atras, o Furia, e uma serie de prototipos brasileiros inclusive o Camber n 17, Alfas GTA, Pumas, Opala e Fusca. Logo os Porsche seriam proibidos de correr no Brasil.
Assim que não é difícil entender por que no imaginário do aficionado brasileiro, os carros esporte e protótipos estavam mais presentes do que monopostos, numa era em que não existia transmissões de F-1. A partir de 1969, começaram a entrar diversos carros de bom pedigrê no Brasil: a Alfa P33 da Jolly, pelo menos duas Lola T70, uma Lola T210, um Ford GT-40, diversos Porsche, inclusive o famoso 908/2 daEquipe Hollywood, um Royale, até mesmo simpáticos Mini-Coopers! Tais carros dominaram as corridas no Brasil de 1969 a 1972, esporadicamente perdendo para os sedãs Alfa GTA e GTAM ou BMW, ou então um Fúria ou Protótipo Bino em tarde inspirada.

Foi também em 1969 que começou a fabricação mais frequente de protótipos brasileiros, numa extensão logica dos hibridos dos anos 50 e 60, seguindo o pioneirismo do Simca Tempestade, dos Fittipaldi (sempre eles, com o Fitti-Porsche de 1967) e dos protótipos Bino da Willys. Geralmente equipados com mecânica VW, alguns tinham motores mais exóticos, como Corvair e Chevrolet Corvette. O AC foi lançado em 1969, por Anísio Campos, e teve, entre outros pilotos,  Chiquinho Lameirão e Wilsinho Fittipaldi. O Fúria foi lançado em 1970, com mecânica FNM, e depois usou motorização Opala, BMW, Ferrari e Chrysler. O protótipo Snob’s, de Eduardo Celidônio, tinha mecânica Corvair. Além dos excêntricos protótipos de Bica Votnamis, com motor Corvette(veja foto a seguir). Sem contar os Patinhos-Feios, feitos em Brasília, e até um esquisito protótipo com carroceria de gesso, que correu nos 1000 km de Brasilia de 1969, e aparentemente desmanchou na pista.   
 Fitti-Porsche em ação
 Protótipo Bino: Grande vencedor
Caçador de Estrelas de Bica Votnamis: carretera, mecânica continental, protótipo, avião, ou o que? Motor V8
Protótipo Casari cm motor Ford
Protótipo Camber, de Alex Dias Ribeiro
Dois AC-VW com Wilson Fittipaldi Jr. e Fritz Jordan
  Como não era todo mundo que tinha dinheiro sobrando ou patrocínio para comprar um carro esporte na Europa, começaram a aparecer diversos construtores nacionais: Newton Pereira, com os seus Newcar, Jacinto Tognato, com o Sabre, Norman Casari, e os seus diversos Casari, Renato Peixoto e o Repe, e o Protótipo Heve dos irmãos Ferreirinha. Sem contar o protótipo Avallone, que apareceu com motor Chrysler e Ford, a partir de 1971.  
  Uma das mais disputadas políticas do governo militar foi a da substituição de importações. Esta visava desenvolver a indústria brasileira, e acabou criando situações tragicômicas, como as dezenas de fabricantes brasileiros de “microcomputadores” dos anos 80, embora tenha gerado, também a Embraer. Com base na tal política, aplicou-se um golpe no automobilismo brasileiro, em pleno 72, ano da primeira conquista de título mundial de automobilismo pelo Brasil: a partir de 1973, não se poderia mais importar carros de corrida no Brasil. No máximo, poderiam correr carros importados que já tinham sido internados no Brasil, mas com motor brasileiro. Assim, aposentaram-se o Porsche 908/2, a Lolinha da Hollywood, as Alfas, Lolas, etc, e todos os outros bólidos que fizeram a festa até 72. O campeonato de Divisão 4 (Protótipos Brasileiros) que já havia sido timidamente disputado em 1972, com 3 provas, ganhou uma importância que não tinha até então.
 
Camilo Cristofaro abrilhantou o campeonato de 73, com seu Furia Chrysler
Pode-se argumentar que o campeonato de Divisão 4 de 1973 foi um clássico. Teve oito corridas, uma raridade para a época, e pelo menos na Classe B (carros de grande cilindrada) foi bastante disputado. Diversas feras da época correram nele: Antonio Carlos Avallone, Chico Lameirão, Pedro Victor de Lamare, Nilson Clemente, Jan Balder. Os emergentes Pedro Muffato(prefeito de Cascavel, Paraná) e Arthur Bragantini. Um desconhecido mineiro, Luis Carlos Pinto da Fonseca. E um mito: Camillo Christófaro correu algumas vezes em São Paulo. Embora não houvesse muita variedade de marcas, pelo menos o Avallone tinha três motorizações diferentes: Chrysler (que ganhou mais corridas), Ford e Chevrolet. Com o Fúria-Chrysler de Camilo ajudava a fazer a diversidade da festa. Durante o ano, Bragantini espatifou o seu Avallone, enquanto liderava o campeonato, e não teve jeito - teve de usar a tal brecha na lei brasileira: enfiou um motor Maverick no Ford-GT40, que assim, se tornou um Divisão 4! Na Classe A, Maurício Chulam foi um grande dominador, com seu Heve, mas Sergio Benoni Sandri, ilustre desconhecido do Paraná, ganhou duas corridas e Newton Pereira, uma. Pelo menos surgiu um concorrente para o Heve: o Polar, primeiro carro brasileiro com chassis monocoque e ainda por cima, motor Ford turbo! Havia mais diversidade de marcas na classe A: Manta (do Paraná), AC, alguns protótipos VW de origem desconhecida, além de um estranho protótipo bi-motor (DKW e VW!!!), Made in Cascavel.
  
O Avallone Chrysler com o qual Antonio Carlos Avallone ganhou o certame de Divisão 4 em 1973, em Interlagos
Jan Balder também correu com o Avallone de "fábrica"
Os grids não eram cheios, mas à primeira vista, parecia que a Divisão 4 se impora como a principal categoria do automobilismo brasileiro. Tinha os carros mais potentes, que chegavam próximos de rodar em Interlagos em menos de 3 minutos. Bons patrocinadores, pilotos - o futuro parecia áureo. E supostamente, logo voltariam os outros carros que tinham sido aposentados pela lei: na Cascavel de Ouro(extra campeonato), por exemplo, a equipe Motoradio estreou uma Alfa T33, ex Jolly, com motor Maverick, pilotada por Angi Munhoz (chegou em 2°).
   Sergio Benoni e Chulam em Interlagos, 1973
Daí veio 1974. Em outros artigos, mencionamos que o ano não foi fácil para o automobilismo brasileiro e mundial. O primeiro choque do petróleo, causado pela guerra de outubro de 1973, no Oriente Médio, tornou a idéia de competir com carros algo completamente politicamente incorreto (numa época em que nem existia o termo) – como se os carros de corrida estivessem consumindo todo o petróleo do mundo, e no caso do Brasil, causassem os desequilíbrios do balanço de pagamentos! A crise chegou com tudo no Brasil, e os calendários simplesmente não foram cumpridos. No final, a Divisão 4 teve só três provas em 1974. A de Goiânia, na inauguração do autódromo, ganha por Antonio Castro Prado, na B, e Marcos Troncon, com um Royale-Chevrolet na A. Antonio Carlos Avallone, campeão no ano anterior, aprontou uma das suas. Tinha cismado de fazer um F-5000 brasileiro, ou seja, monoposto, anunciado com fanfarra na revista Auto-Esporte. Como ninguém se interessasse pela categoria, resolveu colocar alguns para-lamas em cima das rodas, e chamou o carro de Divisão 4!(Curiosamente, mais tarde fez-se a mesma coisa com a segunda versão da série Can-Am nos EUA: carros de F-5000 com paralamas e/ou carenagem – copiaram o Avallone!). Chegou em 2° em Goiânia. As duas últimas etapas foram corridas em Cascavel, sem dúvida com uma ajudinha do prefeito Muffato. E foi ele mesmo que acabou levando o caneco na B, e Chulam na A.
 
Heve VW de Mauricio Chulam: bicho-papao da Divisao 4, tetracampeao 72-73-74-75, Classe A  
Berta Hollywood - sensação de 1975, com Luis Pereira Bueno
Havia esperanças de que as coisas melhorariam em 1975, pois a Caixa Econômica Federal resolveu patrocinar os certames de Divisão 3 e 4. A Divisão 4 correria nos mesmos dias da Super-Vê, tendo um calendário confirmado de 6 provas, e a Divisão 3 se enquadaria no calendário da F-Ford. E havia novidade no ar. A Hollywood conseguiu mandar fazer um protótipo na Argentina, preparado por Orestes Berta, que poderia correr no Brasil contanto que fosse equipado com motor brasileiro. E era equipado com o motor do Maverick.
  No final, o campeonato de 1975 foi um passeio da Hollywood. Chulam ganhou todas as etapas na classe A, e Luisinho Pereira Bueno levou quatro na B (quebrou nas outras duas ocasiões). Muffato conseguiu uma vitória, e Valdir Favarin, que anteriormente pilotava o esquisito bi-motor de Cascavel, ganhou uma corrida com um Manta-Chrysler. 

  Presenciei a última corrida de Divisão 4 no Brasil, a despedida dos protótipos das pistas brasileiras por quase vinte anos. A corrida ocorreu em Interlagos, na decisão da Super-Vê. Pouquíssimos carros largaram, e o Hollywood Berta dominou a corrida, como era de se esperar, e era óbvio que passeava. Em 2o. lugar, Chulam, com o Heve da Hollywood, também passeando. Lembro-me de um protótipo marrom que circulava em patética velocidade pela pista, ou melhor, se arrastava, fazendo um barulhão: era um Manta, com um adesivo que indicava ter um motor FNM. Obviamente era uma categoria agonizante, e de fato morreu no ano seguinte: a Caixa resolveu abandonar o automobilismo brasileiro, patrocinando a temporada de F-2 de Alex Dias Ribeiro, deixando tanto a Divisão 4 quanto a 3 a ver navios. Seguiu-se um logo período em que as categorias monomarcas dominariam o cenário nacional, sem nenhum vestígio de carros esporte ou protótipos.

  É com alegria que vejo que hoje os protótipos estão bem no Brasil. A febre tomou conta após o sucesso dos Aldee nas Mil Milhas e em outras corridas. De fato, constroem-se carros em diversos estados, com motores diferentes. Pilotos antigos, novos, consagrados, homens, mulheres, no sul, sudeste e nordeste. Enfim. Uma bela categoria, que às vezes parece estar mais saudável no Brasil do que no resto do mundo. Que permaneça assim.            
Série de artigos informativos

A (QUASE) ÚLTIMA VITÓRIA DE CAMILO CHRISTÓFARO



Por Carlos de Paula

Camilo Christófaro foi um dos mais populares pilotos brasileiros dos anos 50 e 60. Sobrinho de Chico Landi e mecânico por profissão, não podia dar outra: Camilo acabou virando piloto, obtendo muito sucesso em Interlagos com uma grande variedade de carros, desde FNMs JK até ex Maseratis de F-1 equipadas com motor Corvette, os temíveis Mecânica Continental. Sua carretera número 18 (na última versão) é um dos carros mais lembrados e amados do automobilismo brasileiro, certamente a mais popular carretera,correndo até 1971.

No começo dos anos 70, o automobilismo nacional mudara e já não havia lugar para as carreteras. A 18 tornara-se anacrônica, além de proibida, visto que era equipada com motor Chevrolet Corvette americano. Assim que em 72 Camilo adquiriu um protótipo Fúria, equipando-o com motor Chrysler, correndo com esse carro na Divisão 4 em 1972 73. Nesse último ano lançara-se a Divisão 1, com provas de longa duração e carros com reduzido preparo, e também foi lançado o Ford Maverick V-8. Grande amante dos V-8, Camilo logo se entusiasmou com o modelo e a categoria. Nos anos seguintes, participaria de diversas corridas de Divisão 1 e 3, com Mavericks preparados pela Escuderia Lobo.

Em 1975 a Divisão 1 estava em franca expansão. As 25 Horas de Interlagos não foram realizadas naquele ano, decidindo-se realizar uma prova mais curta, as 500 Milhas de Interlagos. Como as 25 Horas, a prova também fora organizada pelo Avallone Motor Clube, de Antonio Carlos Avallone, e seria realizada na pista completa de Interlagos. Nessa época, a maioria das provas de Interlagos contava com a experiente equipe Sget’s de cronometragem, mas nessa prova estrearia uma nova equipe, a Racing Crono.
 
A Equipe Tecnomotor teve forte presença na Divisão 1 em 1975. Aqui Beto Monteiro, em Brasilia
Entretanto, a prova foi vítima de uma série de confusões, algumas inevitáveis, como a climática. Apesar de 71 carros inscritos, a principal equipe da Divisão 1, a punida Mercantil-Finasa, na qual corria José Carlos Pace, não participaria da corrida embora contasse com a autorização da CBA. Depois, choveu nos treinos de classificação. A maioria dos carros foi para a pista molhada, marcando tempos altíssimos, mas quase no final dos treinos parara de chover e a pista começava a secar. O esperto piloto paranaense Edson Graczyk ficara com seu Opala da equipe Tecnomotor parado nos boxes enquanto chovia. Quando parou de chover, e a pista começou a secar, Graczyk prontamente foi para a pista e marcou a pole position em 4’10”1, com certa facilidade. Em segundo ficou outro Opala de Sergio Carvalho, que não era habituée das primeiras posições, e em terceiro Camilo Christófaro, o primeiro com Maverick. O primeiro Passat, de Alberto Ferreira e Rafael da Luz, marcara o 9° tempo, na frente de diversos carros da Classe C, com 4’15”08, dando uma idéia da aparência inusitada do grid.
 
O Maverick 18 dos Camilos 
Cabe lembrar que nessa época os Maverick simplesmente acabavam com os Opalas nas provas de Divisão 1. A única grande vitória do Opala fora nas 25 Horas de 1974, e os produtos da Ford ganharam todas as outras provas. Assim que a pole de um Opala fez bastante surpresa, e por que não, até mesmo o 3° de Camilo surpreendeu. Este correria em parceira com seu filho Camilo Christófaro Júnior, certamente realizando um sonho ao largar em tão boa posição, junto com o filho. Todo pai cujos filhos correm certamente sonham em correr em dupla, e porque não, ganhar corridas com os rebentos. Os casos são inúmeros não só no automobilismo brasileiro, como internacional.

As 500 Milhas foram transmitidas na TV e a Itacolomy, concessionária Chevrolet, estava oferecendo prêmios para os primeiros, segundos e terceiros colocados com carros da marca, tanto na classe C (Opala) como na A (Chevette). O automobilismo brasileiro dava sinais de evolução nessa época, apesar das pisadas na bola, como veremos a seguir.

No domingo acabou não chovendo, e Camilo Christófaro fez a melhor largada, diga-se de passagem dentro do horário programado, pulando diretamente para a primeira posição. Não só Camilo largou melhor, como começou a abrir distância do segundo colocado Graczyk. Era o Camilo de antigamente, que após 40 minutos de prova, já tinha 23 segundos de diferença sobre o segundo colocado, Arthur Bragantini. Com uma hora de prova, Camilo entrou nos boxes para reabastecer e passar a direção do Maverick número 18 a seu filho, que logo voltou à ponta. Júnior não só manteve a primeira posição, como expandia a diferença em relação aos segundos colocados. Parecia certo que a dupla de Camilos ganharia a prova. Infelizmente, o destino foi outro.
 
Mavericks brigando
Posteriormente, Camilo pai confessou, em uma versão, que muito lhe emocionou a possibilidade de ganhar uma prova em dupla com o filho, e acabou fazendo uma rara burrada. Em outra explicação, disse que foi brincar com Toco, seu amigo de muitos anos, fazendo alguns sinais. Distraiu-se e acabou batendo. Apesar de ter ganho inúmeras disputas em duas décadas, inclusive as Mil Milhas Brasileiras de 1966, Camilo nunca ganhara uma prova com o filho, e há algum tempo estava em jejum de vitórias importantes. Seja a emoção ou brincadeira que lhe fez perder a concentração na volta 59, o sonho dos Camilos terminou em abandono na Curva do Sul. Disse a um repórter “Pode escrever aí que eu sou um salame. Dei uma bobeada. Há vinte anos que corro e hoje aprendi mais uma”. Infelizmente, nunca mais Camilo teve a mesma oportunidade de ser tão competitivo em uma corrida.

Após o abandono de Camilo, a tal equipe Racing Crono simplesmente perdeu o controle da corrida. Na realidade, a única certeza que tinham era de que os Camilos lideravam, e quando estes abandonaram, nem sabiam quem era o líder, tampouco quem ocupava as outras posições. Passaram então a proibir a entrada dos jornalistas na torre de cronometragem, para encobrir sua inépcia. A imprensa, dando cobertura televisiva, não sabia o que dizer ao público, e passou a recorrer aos mapas de corrida extra-oficiais, preparados por algumas equipes, como Chico Landi, Itacolomy, Sonnervig-Vicsa e Manah. Estes apontavam Aloysio/Cesar em primeiro, seguidos de Campello, Bragantini, Graczyk e Marinho Amaral. O clima foi ficando pesado, e o organizador Antonio Carlos Avallone começou a sofrer todos os tipos de pressão, dentre outros do presidente da CBA, Charles Naccache, que estava presente na pista. Após a divulgação dos resultados oficiais, depois de 6 horas de corrida, ocorreu o inevitável: uma enxurrada de protestos. Reynaldo Campello/Marivaldo Fernandes, da Itacolomy, achavam que eram os vencedores, mas Aloysio/Cesar e Graczyk/Carpes também achavam. Resultado: os mapas de corrida tiveram de ser completamente revisados até as 2 horas da manhã, e a divulgação oficial dos vencedores ocorreu  longos 15 dias depois: Aloysio Andrade Filho e Ricardo Lenz Cesar, com Maverick na classe C, e Francisco Artigas/Eduardo Dória com Passat na Classe A. Edson Graczyk e Oswaldo Carpes foram o Opala melhor colocado, em 4° na geral, mas acabaram desclassificados por estarem abaixo do peso. Os Opalas da Itacolomy também acabaram desclassificados, e no final foram Júlio e Marcos Tedesco que levaram os Cr$5.000 da Itacolomy. A desclassificação de Graczyk/Carpes e Campello/Marivaldo se deu a um erro da própria GM, que não havia atualizado o peso dos carros na homologação junto à CBA. Como os Opala estavam saindo da fábrica menos pesados, por usarem componentes mais leves, e o peso indicado na homologação era o antigo, os comissários acabaram desclassificando esses Opalas.

Os mais supersticiosos diriam que foi praga do Camilo!

Resultado Oficial Final das 500 Milhas de Interlagos de 1975:
Classe C e Geral
1. Aloysio Andrade Filho/Ricardo Lenz Cesar – Maverick n° 28 – 92 voltas
2. Artur Bragantini/Tite Catapani – Maverick n° 26 – 92 voltas
3. Marinho Amaral/Manoel Jesus Ferreira – Maverick n° 29 – 92 voltas
4. Júlio Tedesco/Marcos Tedesco – Opala n° 3 – 91 voltas
5. Celso Frare/Carlos Andrade – Opala n° 5 - 91 voltas

Classe A
1. Francisco Artigas/Eduardo Doria – Passat (10° na geral)
2. Alberto Ferreira/Rafael da Luz – Passat
3. Otto Carvalhaes/Alexandre Negrão – Passat
4. Carlos Amaral/Glen Henrique – Passat
5. Charles Marzanasco/Charles Marzanasco Filho - Passat

Torneio Ford Corcel II



O Ford Corcel foi lançado em 1968. Na realidade era o projeto M da Willys, montado sob base Renault. Como a montadora fora comprada pela Ford, em 1967, esta absorveu o projeto, lançando-o com o nome Corcel.

Nas pistas o Corcel nunca teve um desempenho muito bom. Certo que um Corcel pilotado por José Carlos Pace;Bird Clemente chegou em segundo lugar nas 12 Horas de Porto Alegre de 1968, e que Emerson Fittipaldi pilotou um Corcel numa corrida em Belo Horizonte. Também foi realizado um torneio para Corcéis no Rio e São Paulo, no final de 1970. Mas o pequeno Ford não era páreo para os Fuscas na Divisão 3, que naquela altura tinham um bom desempenho com kits 1600 para cima.
Alguns triunfos no Rio Grande do Sul, vitórias em provas de calouros e novatos e uma inusitada vitória na classe A dos 500 km de Interlagos de 1973, com Francisco Gondim/Paulo Caetano, foram os pontos mais altos da carreira competitiva do Corcel I.

Em 1980 o automobilismo brasileiro era dominado pelas monomarcas. De fato, só na D-3 carros de fabricantes diferentes podiam competir com os outros. Que na realidade, se traduzia em um único FIAT contra uma armada de produtos VW, já que os Chevette há muito tinham sido abandonados na categoria.

A Ford retirara o Maverick de linha, e não teve outro remédio senão fazer um Torneio para o Corcel II, para promover seus carros de passeio - seu único outro carro na época era o Galaxie. O Torneio acompanharia o Torneio Brasileiro de Fórmula Ford.

A primeira etapa do Torneio ocorreu na velha pista de Interlagos, em 27 de abril. Para comprovar a inépcia dos Corcel nas pistas, o pole da primeira corrida fez 3m53,13s. Os Passat rodavam na base de 3m42, os Stock Car, 3m22s, e até o FIAT, com motor menor do que o Corcel, rodava em 3m48. Os Divisão 3 já rodavam em 3m22, e os FW 1600, 2m58s. Os Formula Ford, por outro lado, conseguiam rodar Interlagos em 3m13s. Ou seja, era a categoria menos veloz do automobilismo brasileiro.

Só 11 pilotos se inscreveram para a corrida de 2 baterias. O mais famoso acabou sendo o vencedor da prova (e do primeiro campeonato), Aloisio Andrade Filho. Entretanto, ganhou devido a desclassificação de Ernesto Zogbi, que embora largando em último, ganhou as duas baterias. O motor de Zogbi tinha comando de válvulas em medidas não originais. Olicio Santos fez a pole, com pneus não aprovados, e acabou chegando em segundo, seguido do gaúcho Henrique Damo. Entre os corredores estava José Nogueira, conhecido como Graham Hill, por portar um bigode parecido com o do falecido e querido piloto inglês.


O Torneio Corcel II só durou três anos, de 1980 a 1982. Eventualmente Ford lançou o Escort, mais capaz nas pistas. O Torneio Corcel II trouxe um pouco de variedade ao automobilismo, mas certamente, não teve um impacto grande no esporte.

Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador baseado em Miami

PARTICIPAÇÃO DE CARROS DE SÉRIE NACIONAIS NO AUTOMOBILISMO BRASILEIRO – 1956 – 1990



A Isetta foi o primeiro carro produzido no Brasil na fase de implementação de uma indústria automobilística 100% brasileira. O mini-carro, com motorzinho de 250 cc, obviamente não tinha vocação para corridas, embora na própria Europa tenha sido utilizado até na Mil Milhas Italianas, correndo contra Ferraris, Maseratis e Mercedes (com Fangio e Moss a bordo). No Brasil, realizaram-se algumas poucas corridas específicas para Romi-Isettas, durante os anos 50.
DKW

Os carros DKW foram fabricados no Brasil pela Vemag a partir de 1956. Foi e é um dos carros de corrida que mais inspira paixões no Brasil, até hoje, apesar, ou quem sabe por causa, do seu motor de 1 litro e dois tempos. De fato, o DKW não ganhava muitas corridas importantes na geral, mas uma grande parte dos grids das corridas da primeira metade dos anos 60 era formada de DKWs. E ganhou muitas corridas secundárias. Na segunda metade dos anos 50 foram usados DKWs alemães em corridas brasileiras, principalmente no Rio Grande do Sul com Karl Iwers. Nos anos 60, usava-se basicamente o modelo Belcar, embora ainda fossem comuns os DKWs alemães de duas portas. Normalmente, o carro corria na classe turismo, mas houve também DKWs preparados para a categoria carreteras (força livre). A Equipe Vemag foi a primeira equipe de fábrica no Brasil, e seus carros brancos tinham torcida certa em todas as corridas.

O único outro carro de passeio produzido pela Vemag no Brasil foi o Fissore, elegante sedã de duas portas, com mecânica DKW e carroçaria desenhada pelo estúdio Fissore. Não há registro de participações de Fissores em corridas, embora tenha corrido em rallyes. Entretanto, cabe notar que pelo menos uma corrida foi ganha no Brasil, com o utilitario Vemaguete da Vemag: Daniel Winik ganhou uma prova em uma pista de terra, construida em Passo Fundo, em 1966. Passo Fundo teria sido o primeiro autódromo do Rio Grande do Sul, mas não passou da pista de terra. A equipe Vemag também preparara uma Vemaguete braba, que frequentemente batia os tempos dos Belcar, supostamente por ter um melhor coeficiente aerodinâmico. Na década de 70, outro carro considerado utilitário participaria, de ganharia, diversas corridas no Brasil: o VW Brasilia.

WILLYS

O Renault Gordini foi outro carro geralmente usado pelos pilotos que tinham poucos recursos, ou então estreantes. A Willys também montou uma equipe de competição, e usou Gordinis e a sua versão mais preparada, o 1093, com os pilotos mais novos da equipe. Mas foi na mão de particulares que o Gordini participou de mais corridas no Brasil. Carrinho de só 850 cm3, o Gordini basicamente não tinha chances de vitórias na geral. Alguns Gordinis também foram usados como carretera.

Por essa razão, a Willys resolveu fabricar no Brasil um modelo mais adequado para competições, lançando o Interlagos. Baseado em modelo da Alpine francesa, o Interlagos foi homologado como carro de turismo. Um leve GT, de pouco mais de 500 kg, o Interlagos ganhou muitas corridas no Brasil, correndo até 1970 (inclusive com motores não originais). O Interlagos não foi usado só pela equipe oficial: de fato, muitas Berlinetas correram nas mãos de particulares.
Os Aero Willys e Itamaraty não eram bons de pista, mas participaram das corridas. Em rallyes, os Aero até eram bons, chegando a ganhar provas. Geralmente os Aero eram utilizados em provas de estreantes, e numa rara ocasião, um Itamaraty ganhou uma prova de estreantes em Interlagos, em 1966, mas acabou desclassificado. O piloto mais famoso que estreou nas corridas com um Aero Willys foi Eduardo Celidônio.

SIMCA

O terceiro carro mais comum nas pistas nos anos 60 era o Simca Chambord. Com motor de 2,3 litros, o Simca potencialmente tinha tudo para bater os outros carros de turismo, mas às vezes tinha dificuldades para vencer mesmo os DKWs, principalmente nas pistas de rua. Ainda assim, Simcas ganharam muitas corridas na geral, principalmente no Sul (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) e a fábrica mantinha uma equipe de fábrica, que também correu com protótipos, monopostos e modelos importados.

A linha Chambord foi eventualmente substituída pela Regente/Esplanada, e logo após a Chrysler encampou a Simca do Brasil. Estes modelos foram usados em competições no Brasil, tanto na época da Simca, como da Chrysler, principalmente no Sul. O modelo mais “esportivo” do Regente, o GTX, também foi usado em corridas.

VW

A VW demorou algum tempo para se interessar em corridas, apesar do sucesso obtido por um fusca na primeira edição das 1000 Milhas, em 1956. Apesar disso, apareciam, aqui e ali, modelos VWs nas corridas, inclusive diversos com a motorização Porsche. O Fusca teve atuação apagada no começo dos anos 60, mas o preparo de motores VW evoluiu muito durante a década, e eventualmente se tornou um carro de corrida considerável, principalmente na Divisão 3. Alguns Fuscas chegaram a usar motores de 2 litros, além do temível, ou temeroso, Fusca Bi-Motor dos irmãos Fittipaldi, projetado por Richard Divila, que mais tarde viria a projetar o Copersucar-Fittipaldi.

Mas foi com o Karmann Ghia que os produtos VW inicialmente tiveram projeção nas pistas brasileiras. É certo que não eram, a bem dizer, verdadeiros Karmann Ghia, mas sim híbridos com motor Porsche alemão. O primeiro a usar este híbrido com sucesso foi Chico Landi, em 1964, mas a idéia foi abraçada pelo representante da Porsche no Brasil, Paulo Goulart da Dacon, e o modelo basicamente dominou as competições em 1966 e 1967. Karmann Ghias com motor VW foram pouco usados nas corridas, embora Nenem Pimentel tenha ganho diversas corridas regionais no Nordeste, com este modelo.

O próximo modelo VW a ser usado nas corridas, embora infrequentemente, foi o VW 4 Portas, preparado para algumas corridas de Divisão 3. O modelo foi muito usado no Rio Grande do Sul, embora infrequentemente em São Paulo. A evolução do 1600, o TL, foi usado nas primeiras provas de Divisão 1. O Karmann Ghia TC foi usado em provas para estreantes. Já o SP2, apesar de esportivo, não foi usado em corridas, basicamente por não existir uma categoria na qual se enquadrasse. Não podia ser considerado carro de turismo, nem protótipo, e a partir de 1973, não havia uma categoria para carros GT no Brasil.

A Brasília foi bastante usada na Divisão 3 e mesmo na Divisão 1. A Brasília de maior sucesso foi a utilizada por Ingo Hoffmann na Divisão 3, em 1974, com a qual obteve o bi-campeonato. O interesse na Brasilia logo se esvaiu com o lançamento do Passat, que passou a ser a principal arma da VW não só na Divisão 1, como eventualmente na Divisão 3. Com a proibição das corridas de longa distância, em 1977, e após a extinção do Grupo 1, em 1978, criou-se um torneio monomarca Passat. Um dos pilotos que mais se destacou com esse modelo foi o mineiro Antonio (Toninho) da Matta, pai de Cristiano.

Com a criação do Brasileiro de Marcas, a VW passou a se empenhar bastante nas corridas, sendo na realidade a montadora de maior sucesso no campeonato. O Passat foi o principal modelo da VW nesse campeonato, embora no começo do mesmo, fossem usados os modelos Voyage e Gol. A VW ganhou 9 campeonatos seguidos entre 1984 e 1992

FNM

O FNM JK foi o primeiro carro nacional a obter franco sucesso nas pistas. Construído pela empresa estatal FNM, o JK foi durante muitos anos o carro mais moderno(e caro) do Brasil, transmitindo para as pistas este sucesso. Além de ganhar as Mil Milhas de 1960, o FNM, de tecnologia Alfa-Romeo, ganhou diversas outras provas nos anos seguintes, e embora tenha sido fabricado até 1973, foi relativamente pouco usado da segunda metade da década de 60 em diante. As equipes de fábrica passaram a criar ou importar modelos especiais para competição, como o Interlagos, Alpine, Abarth-Simca, Tempestade e Malzoni, ao passo que a semi-falida FNM nunca apoiou uma equipe de fábrica, no mesmo nível que a Simca, Willys e Vemag. Já denominado FNM 2150, o modelo dominou a classe B do campeonato Brasileiro de Turismo de 1972 fazendo frente aos Opalas mais fracos da classe C, e chegou a correr nas primeiras corridas de Divisão 1 em 1973. Foi usado pela última vez em 1976, na inauguração do autódromo de Guaporé, na Classe C da D3, sem qualquer chance contra Mavericks e Opalas. Ainda assim chegou em segundo na fraca classe, atrás do Maverick de Claudio Muller, uma boa despedida.

Em 1974, a FNM lançou o Alfa Romeo 2300, que estreou ganhando a sua classe nas 25 Horas de Interlagos. Infelizmente, devido aos poucos participantes na classe, eventualmente a capacidade máxima da Classe B foi reduzida, desta forma inviabilizando a participação das Alfas na Classe C, onde não tinha a mínima chance contra Opalas 250 S e Mavericks Quadrijet.

FORD

O primeiro carro fabricado pela Ford do Brasil foi o Galaxie, já que até 1967 a fábrica só montava utilitários e caminhões. Embora o Galaxie americano fosse amplamente usado em corridas, tanto na Nascar, como em corridas inglesas e no Campeonato Europeu de Turismo, o modelo lançado do Brasil era completamente impróprio para competições. Entretanto, o motor do Galaxie foi usado por Norman Casari em seu protótipo A-1, e eventualmente, já nos anos 80, foram usados Galaxies na Categoria Turismo 5000 pelo Brasil afora.

O segundo carro lançado pela Ford foi o Corcel. Na realidade, este era um modelo desenvolvido com tecnologia Renault, e de fato seria lançado como substituto do Gordini. O Corcel foi pouco usado em corridas, embora José Carlos Pace e Luis Pereira Bueno tenham usado um modelo para obter o 2° lugar nas 12 Horas de Porto Alegre de 1968. A Ford realizou um torneio Ford Corcel no Rio de Janeiro e São Paulo, em 1971, e mais tarde, o motor do modelo passou a equipar os Fórmula Ford brasileiros. Jeronimo Pereira perseverou com um Corcel Divisão 3 durante alguns anos, mas geralmente ficava entre os últimos. Além disso, diversos Corcel largaram na primeira corrida de Divisão 1 do Brasil, as 25 Horas de Interlagos de 1973. O melhor desempenho do carro na categoria foi a vitória na Classe A, obtida nos 500 km de Interlagos de 1973 no anel interno de Interlagos. Entretanto, o desempenho do carro foi inferior em pistas de menor velocidade, e logo desapareceram da categoria, amplamente dominada por Passats e Chevettes. No Rio Grande do Sul os Corcel geralmente tinham bom desempenho e eram bem preparados. Décio Michel, entre outros, ganhou a prova de inauguração do autódromo de Guaporé, em 1976, com um Corcel, e muitos Corcel participavam das etapas gaúchas de Divisão 3. Entre 1980 a 1982 a Ford promoveu um campeonato monomarca Corcel, já com a versão nova do modelo, o Corcel II. Os torneios foram ganhos por Aloisio Andrade Filho(80) e Olicio dos Santos (81 e 82).

O grande papão da Ford foi sem dúvida o Maverick de 8 cilindros. Este reinou supremo na Divisão 1, entre 1973 a 1976 (no último ano perdendo algumas corridas para o Opala). O Maverick também dominou a Divisão 3, classe C, a partir da segunda metade de 1974 com um Maverick preparado pela Equipe Hollywood e outroi por Grecco. Infelizmente, a Ford decidiu interromper a produção do modelo que consumia muita gasolina, em 1979, mas este continua a ser usado em corridas de Turismo 5000 em diversas pistas do Brasil. O Maverick de 4 cilindros foi usado exclusivamente no seu lançamento, no" Torneio dos Campeões" de 1975, que reuniu pilotos brasileiros de ponta, sul americanos e até Vittorio Brambilla.
O próximo modelo Ford a ser amplamente usado foi o Ford Escort. Este foi a arma usada no Campeonato Brasileiro de Marcas, tendo ganho muitas corridas no curso dos anos, com a marca ganhando as duas últimas edições do campeonato, em 1993 e 1994. Em 1987, o modelo teve acirrada disputa com a Fiat na categoria Turbo. Outro modelo da Ford do período, o Del Rey, não foi usado nas pistas.

GM

Até 1968, a GM só fabricava utilitários, caminhões e ônibus no Brasil. O sucesso da fábrica nas competições se dava ao uso amplo de motores do Chevrolet Corvette nas carreteras e mecânica continental. Apesar disso, o Brasinca foi usado em competições em 1966 e 1967, e este usava mecânica Chevrolet nacional. Foi só com o lançamento do Opala, em 1968, que a GM passou a ter um veículo adequado para competições. E durante 24 anos o Opala obteve muito sucesso nas corridas, na Divisão 3, Divisão 1 e eventualmente na Stockcar. Na última categoria o sucesso do modelo não conta muito, visto que era uma categoria monomarca. Mas cabe lembrar que nos últimos anos do Grupo 1, o Opala bateu os Maverick.

O Chevette foi lançado em 1973, e foi usado nas competições logo após o lançamento. Um Chevette ganhou a sua classe nas 25 Horas de Interlagos de 1973, e de fato, ganhou muitas corridas na classe A, nos anos seguintes, embora eventualmente tenha sido superado pelo Passat. O Chevette também foi usado na Divisão 3, sendo usado já a partir de 1973. Newton Pereira conseguiu o terceiro lugar na classe A, na última prova do CBT de 1973, e diversos outros pilotos usaram o modelo, que chegou a conquistar uma vitória com Edson Graczyk, em 1975. O carro continuou a ser usado esporadicamente na Divisão 3. No Brasileiro de Marcas, o Chevette só conseguiu uma vitória, nos 500 km de Brasilia de 1984, com Ingo Hoffmann/Marco Gracia. A GM foi a única montadora a não ganhar uma única edição do Campeonato. O Monza nunca foi usado em competições.

CHRYSLER
A Chrysler encampou a Simca do Brasil em 1967. Nessa época a Simca fabricava o modelo Regente/Esplanada, que passou a ser chamado Chrysler. Eventualmente, a montadora lançou o GTX. Estes modelos foram usados com pouca freqüência nas competições e eventualmente foram substituídos pelo Dodge Dart. Embora fosse veloz, o Dodge Dart, por ser muito longo, era impróprio para as pistas brasileiras. Diversos pilotos tentaram usar o modelo, em corridas de Divisão 3, entre os quais Nelson Marcílio e Leopoldo Abi-Eçab, sem sucesso. Na Divisão 1, o Dodge Dart também fracassou, embora tenha tido a honra de largar na pole position da primeira corrida da categoria no Brasil (embora não tenha sido o carro mais rápido nos treinos). Muitos anos após sair de linha, os Dojões passaram a fazer sucesso nas corridas de Turismo 5000 no Brasil. Em 1973 a Dodge lançou o Dodge 1800, que eventualmente ganhou o nome Polara, e este acabou sendo o modelo de maior sucesso da montadora na sua breve primeira passagem no mercado brasileiro. De fato, os Dodge 1800 estiveram presentes nas 25 Horas de Interlagos de 1973, embora todos tenham abandonado, mas no curso dos anos, progrediram, chegando a dominar a classe B.

FIAT
Durante anos cogitou-se que a FIAT construiria carros no Brasil. Quando a Vemag estava prestes a ser encampada pela VW, tentou fazer um acordo com a fábrica italiana para construir seus carros no Brasil. Eventualmente a Fiat decidiu apostar no mercado brasileiro, aposta que valeu dividendos, pois hoje é um dos melhores mercados da fábrica no mundo. Apesar da concentração de montadoras no ABC paulista, a Fiat decidiu montar seus carros em Betim, Minas Gerais.
A Fiat logo passou a investir no automobilismo, embora tenha entrado no mercado na época dos torneios monomarcas: afinal, a isso tinha se resumido o Grupo 1, em 1977. Ainda assim, em 1978 a Fiat veiculava uma curiosa propaganda, na qual identificava o número de vitórias obtidas pelo 147 em 1978, sem mencionar, convenientemente, que não tinha concorrentes...

Com o fim do Grupo 1, entre 1979 e 1982 a Fiat promoveu um torneio monomarca para Fiats 147, muito disputado, no qual se sobressaíram Walter Soldan, Luiz Otavio Paternostro, Atilla Sippos e Renato Connil.

O 147 também foi o primeiro modelo usado no primeiro Campeonato Brasileiro de Marcas. Nesse a Fiat de fato teve concorrência, e bastante, das três outras montadoras da época, VW, Ford e GM. A Fiat foi a marca dominante no primeiro campeonato, obtendo quatro vitórias, contra duas da VW. O campeão entre os pilotos, Toninho da Matta, também pilotou Fiat.
Em 84 a Fiat usou o Oggi, obtendo uma vitória, passando a usar o Uno de 1985 em diante. Em 1987, havia uma categoria Turbo, que foi fortemente disputada entre o Fiat Uno e o Escort Turbo.

PUMA
O Malzoni foi o primeiro “fora de série” brasileiro a ser usado nas pistas. Com mecânica DKW, este primeiro “Puma” teve algumas vitórias e participações importantes entre 1964 e 1967, mas com a interrupção da fabricação dos DKW no Brasil, em 1967, o Puma propriamente dito passou a usar mecânica VW. Entre 1968 e 1972, muitos foram os Pumas usados nas corridas brasileiras, obtendo algumas vitórias importantes. Certamente com mecânica 2 litros o Puma era forte candidato até mesmo a vitória geral. A partir de 1972, desapareceu das pistas, por não existir mais uma categoria na qual se enquadrasse. O Puma Chevrolet nunca foi usado em corridas. Eventualmente, já nos anos 90, foram usados Pumas em algumas edições das Mil Milhas.

FORAS DE SÉRIE
O Brasinca foi o primeiro carro com motorização Chevrolet nacional a ser usado em corridas no Brasil. O carro projetado por Rigoberto Soler teve vida curta não só nas pistas como fora. Dado o motor de grandes proporções usado pelo carro, seu cofre era muito grande, dando ao veículo uma aparência peculiar. Walter Hahn usou um modelo no campeonato paulista de 1966, chegando a bater Alfas importadas da equipe Jolly.

Outro “fora de série” a ser usado nas pistas foi o Lorena, modelo de pouca produção, cujo maior feito foi ganhar o 1000 km da Guanabara de 1968, embora nessa ocasião estivesse equipado com um motor Porsche (a versão de “rua” era equipada com VW).

Apesar de um sem número de “foras de série” brasileiros, produzidos entre os anos 70 até a liberação das importações de carros no País, a partir de 1990, entre os quais Santa Matilde, Bianco, etc etc., estes veículos nunca tiveram oportunidade de ser usados em corridas, por não existir categoria na qual se enquadrassem.

Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador baseado em Miami

AS MIL MILHAS DE 1967


Por Carlos de Paula

A prova Mil Milhas de 1967 foi muito importante por uma série de razões, que a diferenciaram de todas outras edições:

Primeiro, foi a primeira corrida no Brasil, desde 1960, a contar com a participação de pilotos europeus, assim quebrando o gelo do isolamento do País em relação ao automobilismo do primeiro mundo. Quatro carros portugueses foram inscritos, dois Lótus Europa, um Porsche 911 e um Ford Cortina.

Segundo, foi a última corrida a ser realizada em Interlagos, até 1970, pois o autódromo seria fechado para obras. Assim, fechava-se um capítulo do velho autódromo, que nos idos de 1967 estava realmente caindo as pedaços. A nova edição da pista teria guard-rails modernos, boxes de gente grande, pista recapeada, além de arquibancadas para grande público.

Terceiro, foi a única vitória da grande equipe Willys na famosa corrida, com um fabuloso 1-2. É certo que a Willys pouca chance tivera de ganhar a prova anteriormente:  na realidade, só participou da edição de 1966.  Mas esta vitória veio a abrilhantar o currículo da grande escuderia.

Quarto, o recorde de Interlagos, que datava de 1957, foi quebrado, e ainda por cima com um carro produzido no Brasil. O Fitti-Porsche tinha chassis desenhado e produzido no Brasil, com motor Porsche alemão. Wilson Fittipaldi Junior quebrou o recorde nos treinos, obtendo a marca de 3m32s 4/10 (o recorde antigo, de Ciro Cayres, era de 3m37s), e depois seu irmão Emerson melhorou a marca, 3m31s 8/10.
 
Um estudo de contrastes: o anacrônico e o moderno, o passado e o futuro do automobilismo brasileiro. Nesse caso, uma vitória relativa do passado: a carretera de Marsilio chegou em 7o., o Fitti-Porsche de Emerson dominou, mas abandonou. No confronto da resistência, ganhou o passado.
Quinto, foi a última Mil Milhas em que uma carretera teve chances reais de vitória. As carreteras haviam ganho todas outras edições, exceto uma, a de 1960, ganha por um FNM. Nessa corrida, a carretera de Camilo Christofaro/Eduardo Celidônio, que havia ganho a edição de 1966, largaria em 2° lugar. As outras carreteras na prova, de Nelson Marcilio/Zé Peixinho/Donato Malzoni, Aires Bueno Vidal/Chuvisco e Salvador Cianciaruso/Domingos Papaleo não demonstravam nenhuma condição de batalhar pela vitória. Marcílio ainda inscreveria sua carretera na edição de 1970, assim como Antonio Versa/Alfredo Santili, mas naquela altura as carreteras haviam perdido completamente a competitividade.

Todas as grandes equipes e a maioria dos bons pilotos da época participaram. Além dos Fittipaldi, com seu protótipo, a Equipe Palma de Portugal inscreveu um Lotus  para Manuel Nogueira Pinto/D’Andrade Vilar, outro para Carlos Santos/Luis Fernandes e um Ford Cortina para Antonio Peixinho/Augusto Palma. Os portugueses haviam trazido um Porsche 911, que seria alugado para Anísio Campos/Jose Carlos Pace, mas na hora “H”, as partes envolvidas tiveram um desacordo, e Nogueira Pinto resolveu não alugar o carro, usando-o na prova. Por sua vez, Anísio/Pace correram com um dos ex-Karmann Ghia Porsche da Dacon.
 
A horripilante carretera de Aires Bueno Vidal e o Malzoni de Casari se estranham
Curiosamente, as Alfa Romeo que sempre tinham bom desempenho em corridas longas, tiveram um pífio resultado nas Mil Milhas de 1967. Oito carros da marca largaram, sendo quatro FNMs “made in Brazil”, e quatro Alfas italianas. Somente um dos exemplares da fábrica chegou, em 16°lugar. A Jolly inscreveu a GTA 23 para Zambello/Ubaldo Lolli, a Zagato para Totó Porto/Cacaio e uma Giulia TI para Lameirão/Valdemir Costa. Lolli impôs um ritmo forte no começo da prova, seguindo o Fitti-Porsche, e depois liderando, mas acabou com o platô quebrado, mesmo destino da Zagato. Já a Giulia TI teve o distribuidor quebrado. Jaime Silva fez dupla com Ugo Galina em um FNM, andou na frente até da Giulia,  mas também quebrou.

Alguns carros com motorização DKW participaram, entre os quais a carretera Mickey Mouse, que chegou em 5° lugar pilotada pelo Volante 13 e Roberto dal Pont. Norman Casari e Celso Gerbassi correram com um Malzoni, carro que quase ganhara a edição anterior da prova, e abandonaram.

Entre os inscritos, a última participação de Simcas nesta prova, tendo o melhor exemplar chegado em 11° lugar (Zoroastro Avon/Freddy O’Hora). Ângelo Gonçalves  inscreveu um dos seus Karmann Ghia-Corvair, que chegou em 15° com Carlos Alberto Sgarbi e Jan Balder. Além do KG da Dacon, que não durou mais de uma hora, foi inscrito um KG-Porsche para Sergio Cardoso e Ailton Varanda, do Rio de Janeiro, que marcou o 5° tempo nos treinos. Entre os carros de baixa cilindrada, diversos Renault participaram, incluindo Berlinettas, R-8, Rabo Quente e 1093. O carro melhor colocado da marca chegou em 9° lugar, com Pedro Oliver/Fausto Dabbur. Três VW foram inscritos, inclusive um protótipo construído por Ricardo Achcar, baseado em chassis de Fórmula Vê e construído em 20 dias. Nada tinha da beleza do Polar construído pelo carioca na década de 70 . Um dos VW, o carro número 87 de Fritz Jordan, fez uma corrida excepcionalmente regular, apesar de não ser muito veloz, e chegou em 6° lugar com Nathaniel Towsend e Fritz Jordan. Por fim, uma Fiat Abarth, tocada por Silvio Toledo Piza e Renato Lenci, que abandonou a prova.

A corrida foi da Willys. Com Luis Antonio Greco nos boxes, os dois carros, pilotados pelas duplas Luis Pereira Bueno/Luis Fernando Terra Smith e Bird Clemente/Marivaldo Fernandes, dominaram a corrida após os carros mais velozes apresentarem defeitos na parte inicial da corrida. Sem dúvida, no quesito velocidade o protótipo Fitti-Porsche era inalcançável: aliava leveza, aerodinâmica, motor potente e dois excelentes pilotos. Infelizmente, na sua história o Fitti-Porsche também demonstrou ser frágil. A GTA de Lolli impôs ritmo forte no inicio da corrida, e logo apresentou problemas. Os portugueses, no Porsche, não ameaçaram no início, apesar do óbvio potencial, optando por uma corrida de espera, que pagou dividendos no final. Camilo e sua carretera tiveram boa performance no inicio da corrida, mas eventualmente a embreagem cedeu. O Mark I n° 21 rodou como relógio, embora o n° 22, de Bird/Marivaldo, tenha parado quase 19 minutos nos boxes, sendo ameaçados por Nogueira Pinto/D’Andrade Villar.  A carretera Ford de Marsílio/Zé Peixinho e Donato Malzoni conseguiu fazer 165 voltas, chegando em 7° lugar. A última “conquista” das carreteras na grande prova do automobilismo brasileiro.  
 
Equipe Willys: triunfo merecido na grande prova do automobilismo brasileiro.
Grande público, grande renda, grandes prêmios e grande prova.

Depois disso, Interlagos hibernou.