A primeira corrida monomarca no Brasil foi a 24 Horas de Interlagos de 1951, disputada exclusivamente com veículos da marca Mercedes Benz. Nos anos 60, vez por outra realizavam-se Festivais de Marcas em Interlagos, uma corrida só para Gordini, outra para DKW e ainda outra para Simca. Em 1967, embalados pela euforia pela nascente Fórmula Vê, foi realizada uma prova só para Fuscas em Interlagos, ganha por Emerson Fittipaldi.
Ou seja, o Torneio Ford Corcel de 1970 não inovava muito em termos de corridas para carros de uma marca só, mas sob alguns aspectos foi, de fato, pioneiro. Foi o primeiro Torneio com mais de uma corrida (nesse caso, somente duas) para um carro de uma única marca no Brasil. Segundo, os carros foram gratuitamente fornecidos pela fábrica a algumas dezenas dos melhores pilotos do País. Terceiro, foram dados dois carros de prêmio pela Ford - um excelente prêmio para a época.
Os carros eram basicamente carros de Divisão 1, ou seja, com o mínimo de preparo. E como o Corcel simples não era grande coisa em termos de performance, dá para imaginar que velocidade não era o ponto principal do Torneio. De fato, o recorde de Interlagos acabara de ser batido por Gianpiero Moretti numa Ferrari 512 uma semana antes do Torneio Corcel. A Ferrari fez 2m58.5, a melhor volta de um Corcel no torneio, em Interlagos, foi 4m29s!!! Bólidos não eram os Corcel, mas é verdade que mau o estado da pista encharcada em nada ajudava o desempenho.
Como os carros eram praticamente idênticos, e o prêmio muito bom (em Interlagos, uma Belina ou um Corcel GT para o vencedor, no Rio, uma Belina) o pessoal se animou bastante. Todo mundo queria ganhar as corridas e levar um carro para casa, quem sabe dois!
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A prova de São Paulo foi realizada no dia 29 de novembro. A corrida seria feita em duas baterias classificatórias e uma final. Os doze melhores de cada bateria disputariam a final. Inúmeros pilotos de primeira de diversos estados, e alguns não muito conhecidos, disputaram as duas provas. Luiz Pereira Bueno, Jaime Silva, Chico Lameirão que voltava a correr no Brasil, Bob Sharp, Mauricio Chulam, Jose Moraes Neto, Anísio Campos, Antonio da Matta, Roberto dal Pont, Heitor Peixoto de Castro, Ubaldo César Lolli, Sergio Withers, Milton Amaral, Ricardo Achcar, Antonio Dias Ramos, Amauri Mesquita, Fabio Crespi, Maneco Combacau, Pedro Victor de Lamare, Frederico Leal, Sidnei Cardoso, Mario Olivetti estiveram entre os pilotos presentes.
O mineiro Da Matta ganhou a primeira classificatória em Sampa, seguido de Sharp, Combacau, Lameirão e Ubaldo. A segunda bateria poderia ter sido uma corrida de motonáutica de tão cheia de água que estava a pista, mas ainda assim, Jaime Silva e Pedro Victor de Lamare mantiveram o público vidrado, chegando nos dois primeiros lugares com poucos centímetros de diferença. Na final, Luizinho Pereira Bueno, que havia se classificado por muito pouco na diluviana segunda bateria, ganhou a final de 10 voltas. Luizinho rodou, mas conseguiu descontar a diferença aberta por Jaime Silva, terminando a prova com 45 minutos e 28,9 segundos, na média de 100,120 km/h, seguido de Jaime, Ubaldo, Sharp, Jose Moraes, Lameirão, Da Matta, Chulam, Withers e Miltinho Amaral. As posições foram muito disputadas, com muitas batidas e rodadas. Afinal de contas, a Ford era dona dos carros, não os pilotos, que se dane a Ford...
A etapa carioca se deu uma semana depois, e foi a revanche dos cariocas. Na primeira eliminatória Milton Amaral e Fabio Crespi controlaram a bateria inteira, seguidos de Moraes, Alex, Achcar e Luizinho. Os dois últimos largaram na última fila, e tiveram que ultrapassar muitos carros para chegar nessas posições ponteiras. 23 carros largaram nessa bateria. Na segunda eliminatória os cariocas se deram bem de novo, e desta feita o vencedor foi Amauri Mesquita. Sina das segundas baterias, choveu bastante novamente. Ubaldo César Lolli quase tira a vitória de Amauri, mas perdeu uma roda na volta de número 12.
Na final Fabio Crespi saiu na frente, seguido de Amaral, Mesquita, Chulam, Moraes, Dias Ramos e Luizinho. Na segunda volta, Miltinho capota, culpando Chulam pelo desagradável incidente, um super totó. Amauri liderou algumas voltas, mas logo assumiu a ponta o Ricardo Achcar, e estes dois brigam por muitas voltas. Eventualmente Amauri quebra uma roda (muitas rodas quebradas na corrida...), e Achcar fica numa excelente posição de ganhar a corrida, até que fura um pneu. Mauricio Chulam o ultrapassa e ganha a bandeirada. Só que os comissários não deixaram por menos a indiscrição de Mauricio no incidente com Amaral, e Chulam foi desclassificado, ficando a vitória, e a Belina, com Achcar.
A Ford ficou feliz com o resultado, e chegou a cogitar de realizar um torneio Corcel para novatos e estreantes de 18 a 25 anos de idade. Até por que, o que fazer com os carros batidos e massacrados no Torneio, vender para quem? O vencedor de cada uma das dez provas ganharia um Corcel e o vencedor do torneio, uma viagem para disputar a Formula Ford na Inglaterra. As corridas seriam realizadas em Interlagos, Rio, Porto Alegre e Curitiba. Não é preciso dizer que a ideia não deu em nada, e que, de fato, depois dessa corrida até o pobre autódromo do Rio ficaria interditado para corridas de nível nacional.
Eventualmente a Ford realizou o Torneio dos Campeões em 1975, em Interlagos, para promover o Maverick 4 cilindros, e no final dos anos 70 o automobilismo brasileiro poderia ser melhor descrito como o paraíso da monomarca.
Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo, apesar das intrigas da oposição
Ou seja, o Torneio Ford Corcel de 1970 não inovava muito em termos de corridas para carros de uma marca só, mas sob alguns aspectos foi, de fato, pioneiro. Foi o primeiro Torneio com mais de uma corrida (nesse caso, somente duas) para um carro de uma única marca no Brasil. Segundo, os carros foram gratuitamente fornecidos pela fábrica a algumas dezenas dos melhores pilotos do País. Terceiro, foram dados dois carros de prêmio pela Ford - um excelente prêmio para a época.
Os carros eram basicamente carros de Divisão 1, ou seja, com o mínimo de preparo. E como o Corcel simples não era grande coisa em termos de performance, dá para imaginar que velocidade não era o ponto principal do Torneio. De fato, o recorde de Interlagos acabara de ser batido por Gianpiero Moretti numa Ferrari 512 uma semana antes do Torneio Corcel. A Ferrari fez 2m58.5, a melhor volta de um Corcel no torneio, em Interlagos, foi 4m29s!!! Bólidos não eram os Corcel, mas é verdade que mau o estado da pista encharcada em nada ajudava o desempenho.
Como os carros eram praticamente idênticos, e o prêmio muito bom (em Interlagos, uma Belina ou um Corcel GT para o vencedor, no Rio, uma Belina) o pessoal se animou bastante. Todo mundo queria ganhar as corridas e levar um carro para casa, quem sabe dois!
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A prova de São Paulo foi realizada no dia 29 de novembro. A corrida seria feita em duas baterias classificatórias e uma final. Os doze melhores de cada bateria disputariam a final. Inúmeros pilotos de primeira de diversos estados, e alguns não muito conhecidos, disputaram as duas provas. Luiz Pereira Bueno, Jaime Silva, Chico Lameirão que voltava a correr no Brasil, Bob Sharp, Mauricio Chulam, Jose Moraes Neto, Anísio Campos, Antonio da Matta, Roberto dal Pont, Heitor Peixoto de Castro, Ubaldo César Lolli, Sergio Withers, Milton Amaral, Ricardo Achcar, Antonio Dias Ramos, Amauri Mesquita, Fabio Crespi, Maneco Combacau, Pedro Victor de Lamare, Frederico Leal, Sidnei Cardoso, Mario Olivetti estiveram entre os pilotos presentes.
O mineiro Da Matta ganhou a primeira classificatória em Sampa, seguido de Sharp, Combacau, Lameirão e Ubaldo. A segunda bateria poderia ter sido uma corrida de motonáutica de tão cheia de água que estava a pista, mas ainda assim, Jaime Silva e Pedro Victor de Lamare mantiveram o público vidrado, chegando nos dois primeiros lugares com poucos centímetros de diferença. Na final, Luizinho Pereira Bueno, que havia se classificado por muito pouco na diluviana segunda bateria, ganhou a final de 10 voltas. Luizinho rodou, mas conseguiu descontar a diferença aberta por Jaime Silva, terminando a prova com 45 minutos e 28,9 segundos, na média de 100,120 km/h, seguido de Jaime, Ubaldo, Sharp, Jose Moraes, Lameirão, Da Matta, Chulam, Withers e Miltinho Amaral. As posições foram muito disputadas, com muitas batidas e rodadas. Afinal de contas, a Ford era dona dos carros, não os pilotos, que se dane a Ford...
A etapa carioca se deu uma semana depois, e foi a revanche dos cariocas. Na primeira eliminatória Milton Amaral e Fabio Crespi controlaram a bateria inteira, seguidos de Moraes, Alex, Achcar e Luizinho. Os dois últimos largaram na última fila, e tiveram que ultrapassar muitos carros para chegar nessas posições ponteiras. 23 carros largaram nessa bateria. Na segunda eliminatória os cariocas se deram bem de novo, e desta feita o vencedor foi Amauri Mesquita. Sina das segundas baterias, choveu bastante novamente. Ubaldo César Lolli quase tira a vitória de Amauri, mas perdeu uma roda na volta de número 12.
Na final Fabio Crespi saiu na frente, seguido de Amaral, Mesquita, Chulam, Moraes, Dias Ramos e Luizinho. Na segunda volta, Miltinho capota, culpando Chulam pelo desagradável incidente, um super totó. Amauri liderou algumas voltas, mas logo assumiu a ponta o Ricardo Achcar, e estes dois brigam por muitas voltas. Eventualmente Amauri quebra uma roda (muitas rodas quebradas na corrida...), e Achcar fica numa excelente posição de ganhar a corrida, até que fura um pneu. Mauricio Chulam o ultrapassa e ganha a bandeirada. Só que os comissários não deixaram por menos a indiscrição de Mauricio no incidente com Amaral, e Chulam foi desclassificado, ficando a vitória, e a Belina, com Achcar.
A Ford ficou feliz com o resultado, e chegou a cogitar de realizar um torneio Corcel para novatos e estreantes de 18 a 25 anos de idade. Até por que, o que fazer com os carros batidos e massacrados no Torneio, vender para quem? O vencedor de cada uma das dez provas ganharia um Corcel e o vencedor do torneio, uma viagem para disputar a Formula Ford na Inglaterra. As corridas seriam realizadas em Interlagos, Rio, Porto Alegre e Curitiba. Não é preciso dizer que a ideia não deu em nada, e que, de fato, depois dessa corrida até o pobre autódromo do Rio ficaria interditado para corridas de nível nacional.
Eventualmente a Ford realizou o Torneio dos Campeões em 1975, em Interlagos, para promover o Maverick 4 cilindros, e no final dos anos 70 o automobilismo brasileiro poderia ser melhor descrito como o paraíso da monomarca.
Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo, apesar das intrigas da oposição
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